Saturday, 5 February 2011

PRINCESA MARIA ADELAIDE DE BRAGANÇA


NO PASSADO DIA 31 DE JANEIRO COMPLETOU 99 ANOS UMA GRANDE DE PORTUGAL

As mais extraordinárias obras são por vezes desconhecidas da imensa maioria, para quem apenas é notícia aquilo que a imprensa entende divulgar. As obras de assistência social são hoje geralmente aceites como da atribuição desse ente que flutua acima das nossas mortais consciências e que se convenciona denominar como Estado. Esta mirífica entidade do éter, é afinal a soma de todos os portugueses e esta é uma clara verdade que não queremos reconhecer, devido ao muito luso e atávico costume do desinteresse pela coisa pública. Esquecemos facilmente associações beneméritas – algumas velhas de séculos – e que preencheram o imenso vazio que as mentalidades de outrora votavam a de dezenas de gerações que permaneceram na desafortunada base da pirâmide social.

Outra injustiça a apontar, consistirá sem dúvida, no progressivo e intencional desprestigiar de termos que encontram a sua razão mais profunda naquilo que de essencial deverá ter o cristianismo que conformou a Europa que conseguimos ser: a Caridade, hoje olhada como princípio anacrónico nos países do Sul, mas que noutras paragens onde o desenvolvimento humano é a essencial condição para a paz social, consiste num elo fundamental da educação geral, cobrindo intransponíveis lacunas e erguendo bem alto, a verdadeira solidariedade que se traduz num trabalho permanente e sempre no sentido da formação das gentes. Deverá ser essa então, a grande função de uma Igreja que se ainda impressiona pelo aparato de Te Deums e de cerimoniais herdados de milenares e já desaparecidas civilizações, encontra a sua quase exclusiva razão de ser na protecção, resgate e emancipação dos mais desprotegidos.

Ao longo da nossa História, muitas foram as personalidades que se interessaram verdadeiramente pelo outro, sem que isso obedecesse às normais e aceites regras impostas pelo preceituado social vigente. Quantas vezes anonimamente dedicaram as suas vidas a quem menos podia, enfrentando a mofa e o preconceito, removendo colossais escolhos para a prossecução de uma obra e crendo num futuro melhor e mais justo?

Dª Maria Adelaide de Bragança é um destes exemplos desconhecidos para a imensa maioria dos portugueses. Residente na Outra Banda, em Murfacém (Trafaria), tem um percurso de vida que no século XX português só pode encontrar paralelo na grandiosa obra benemérita – e também na maior parte das vezes no mais rigoroso anonimato – da rainha D. Amélia.

Nasceu a 31 de janeiro de 1912, em S. Jean de Luz (França), quando a Lei do Banimento impedia a presença de membros da Casa de Bragança em solo português. Viveu a juventude na Áustria, trabalhando como assistente social e enfermeira. Durante a II Guerra Mundial percorria a cidade durante os bombardeamentos nocturnos, prestando o auxílio às vítimas. Membro do subterrâneo movimento de resistência anti-nazi, foi detida e condenada à morte, pelo tribunal fortemente controlado pela Gestapo e apenas a intervenção de Salazar junto de Berlim, permitiu a sua libertação, sob a protecção do Estado português, alegando a sua condição de Património Nacional. Imediatamente deportada para Suíça, ali permaneceu junto do seu exilado irmão D. Duarte Nuno, Duque de Bragança.

Casada com o médico holandês Nicolaas van Uden, estabeleceu-se em Portugal em 1949 e iniciou a sua actividade de âmbito social na zona da Trafaria e Monte de Caparica. Dedicou-se à protecção às crianças das áreas degradas, recolhendo-as sob os auspícios da Fundação D. Nuno Álvares Pereira (em Porto Brandão), à qual presidia. Durante anos criticou desassombradamente a 2ª República pelo seu pendor repressivo e pelo caótico estado de pobreza a que votava uma grande parte da população portuguesa. Era uma visita bem conhecida dos mercados, onde sempre podia contar com o precioso auxílio das vendedoras de géneros que jamais regateavam aqueles bens essenciais à subsistência dos numerosos protegidos da Infanta.

Ainda vive e aos 99 anos permanece num rigoroso anonimato, mas sempre interessada no dever para com o próximo e no abnegado cumprimento da missão entre nós pioneiramente iniciada pela sua madrinha de baptismo, a Rainha Dª Amélia.

Nas memórias de Álvaro Lins, o embaixador do Brasil em Lisboa, para sempre ficou conhecida como a Infanta Vermelha. Dª Adelaide bem merece ser considerada como uma Grande de Portugal.

Nuno Castelo-Branco



Ontem, por ocasião duma pequena entrevista para o próximo número do Correio Real, desloquei-me com o nosso ilustre presidente João Mattos e Silva à outra banda onde tivemos o privilégio de privar por umas horas com uma verdadeira Princesa, tão ou mais encantada que as dos romances e do cinema: falo de D. Maria Adelaide de Bragança, infanta de Portugal, que por insólita conjugação de duas paternidades muito tardias e da sua provecta idade, é hoje uma neta viva do rei D. Miguel, esse mesmo do absolutismo e do tradicionalismo, da guerra civil de 1828 – 1834.

D. Maria Adelaide nasceu em 1912 no exílio, em St. Jean de Luz, cresceu e viveu na Áustria aventuras e desventuras de pasmar: habitando no olho do furacão, após a I Grande Guerra coabitou com os ocupantes comunistas da quinta em que vivia, dos quais recorda dos seus esbeltos cavalos e boinas vermelhas. Mais tarde, durante a ocupação nazi, foi presa pela Gestapo por várias semanas em Viena onde como enfermeira se juntara à resistência e acudia os feridos entre bombardeamentos. Foi nestas correrias e aflições que veio conhecer um estudante de medicina de seu nome Nicolaas van Uden com quem casou.

Regressada a Portugal em 1948 após a revogação da lei do banimento, a Infanta veio residir perto da Trafaria, onde criou a Fundação D. Nuno Álvares Pereira, instituição de apoio a mães pobres em fim de gravidez e crianças abandonadas, dedicando fervorosamente a sua vida aos mais desfavorecidos.

Longe das fugazes ribaltas e feiras de vaidades, a Senhora D. Maria Adelaide, afilhada de baptismo de D. Amélia e D. Manuel II, além de constituir um precioso testemunho vivo, directo e indirecto, da História dos últimos duzentos anos, é um verdadeiro exemplo de profunda Nobreza aliada a uma invulgar bravura e irreverência.

João Távora

(Fonte: Blogue da Real Associação de Lisboa)

Dona Maria Adelaide Manuela Amélia Micaela Rafaela de Bragança

(Leiam a mais recente entrevista a Dona Adelaide nas páginas 8 e 9 do Correio Real nº 2)

Publicada por Real Associação Beira Litoral em 00:10

Sábado, 5 de Fevereiro de 2011


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