Tuesday, 14 December 2010

PREC: ELP, PARADELA DE ABREU, JORGE JARDIM E D. FRANCISCO MARIA DA SILVA

 


30 anos do PREC: O Norte a ferro e fogo

Manuel Catarino

Correio da Manhã

O povo do Norte do País foi surpreendido, a partir do início de Junho de 1975, por vários panfletos do ELP (Exército de Libertação Português) – um grupo de extrema-direita disposto a travar a tiro, à bomba e pelo fogo os que chamava de «assassinos comunistas». A propaganda distribuída clandestinamente pelo ELP era um claro apelo ao terrorismo: «Cada Português deve ser um Combatente».

Sedes do PCP, do MDP/CDE e da UDP foram atacadas à bomba, assaltadas ou reduzidas a cinzas por fogo posto. Ao longo do “Verão Quente” de 1975, registou-se pelo menos uma centena de atentados, sobretudo no Norte do País. Os primeiros tiveram como alvo a sede do MDP/CDE, em Bragança, no dia 26 de Maio, e o Centro de Trabalho do PCP, de Fafe, em 12 de Junho. Ao lado do ELP nestas acções directas o Movimento Democrático de Libertação de Portugal (MDLP) – dois movimentos ligados à extrema-direita civil e militar que actuavam clandestinamente a partir de Espanha.

Entre esses “exilados” no outro lado da fronteira, estavam Paradela de Abreu – o homem que em Fevereiro de 1974, no estertor do Regime, editou o livro de António de Spínola, Portugal e o Futuro, que defendia uma solução política para as colónias e abriu caminho ao golpe de 25 de Abril – e o engenheiro Jorge Jardim, antigo secretário de Estado de Oliveira Salazar, que ganhou fama e glória em Moçambique, como empresário, político, agente secreto, amigo pessoal de Ian Smith, líder da Rodésia, e do presidente Banda, do Malawi.

Paradela de Abreu tinha um plano – um plano aparentemente impossível de pôr em prática: pretendia colocar a Igreja no combate de acção directa contra o avanço da revolução. Sonhava fazer de cada padre um chefe político, servir-se dos púlpitos como tribunas de esclarecimento, transformar cada paróquia num reduto anticomunista. Este sonho de Paradela era o embrião do movimento “Maria da Fonte” – uma tendência que acabou por aglutinar o ELP e o MDLP.

O Norte do País, região tradicionalmente mais conservadora, seria terreno fértil para lançar as sementes do movimento “Maria da Fonte”. Era preciso, no entanto, colocar a Igreja do mesmo lado. Aqui entra o engenheiro Jorge Jardim, personagem talhado para as artes das operações especiais. Jardim põe então em prática um temerário plano, digno de um enredo de espionagem, para envolver a hierarquia da Igreja do Norte na luta da contra­‑revolução. Primeiro passo: obter o apoio do arcebispo de Braga, D. Francisco Maria da Silva.

Nem Jorge Jardim, nem Paradela de Abreu falaram com o prelado. Se ele afastasse qualquer hipótese de colaboração o plano iria por água abaixo – risco que eles não quiseram correr. Escolheram caminhos ínvios. Empurraram o arcebispo para a luta sem ele suspeitar, por um segundo, que estava a ser manobrado.

Em meados de Junho de 1975, faz agora 30 anos, D. Francisco Maria da Silva estava de partida para uma viagem pastoral ao Brasil. O avisado Jorge Jardim viu aí uma oportunidade de ouro.

Fez chegar uma carta anónima ao COPCON – uma espécie de “guarda pretoriana” da revolução comandada por Otelo Saraiva de Carvalho – com uma mentira calculada: D. Francisco Maria da Silva preparava­‑se para abandonar o País, com destino ao Brasil, na posse de muito dinheiro que não lhe pertencia. No dia da viagem, 13 de Junho, quando chegou ao Aeroporto das Pedras Rubras, o arcebispo foi imediatamente cercado por um pelotão de espingardas G-3 aperreadas. D. Francisco Maria da Silva sofreu a maior humilhação da sua vida. Os militares levaram-no à força para uma sala e despiram-no dos pés à cabeça. A bagagem foi revistada. Mas do dinheiro nem o mais leve sinal. O arcebispo sentiu na pele as agruras da revolução. Era isso que Jorge Jardim e Paradela de Abreu pretendiam – que ele se sentisse ofendido com os desmandos da tropa.

Quando regressou do Brasil, em finais de Junho, o arcebispo vinha disposto a travar um combate contra o Partido Comunista. A estratégia engendrada pelos líderes do movimento “Maria da Fonte” resultara em cheio. Paradela de Abreu entra clandestinamente em Portugal para um encontro com D. Francisco Maria da Silva. O arcebispo aceita colocar a “sua” Igreja ao serviço do grande desígnio da luta anticomunista e destaca um eclesiástico do cabido da Sé de Braga para apoiar a revolta – o então cónego Eduardo Melo.

Nas semanas que se seguiram, o Norte de Portugal ficou a ferro e fogo: registaram-se durante o Verão, pelo menos, uma centena de atentados contra sedes do PCP, MDP/CDE e UDP. Enquanto as sedes comunistas eram atacadas, a Igreja organizava manifestações nas principais cidades do Norte – foi assim em Aveiro, Bragança, Coimbra, Lamego, Braga, Vila Real, Viana do Castelo.

REVOLUÇÃO DIA A DIA

12 de Junho – Todas as empresas de transportes públicos nacionalizadas dão origem a uma só – nasce a Rodoviária Nacional; Militares do MFA passam a dirigir a Emissora Nacional.

13 de Junho – O Presidente da República, general Costa Gomes, parte em visita à Roménia.

16 de Junho – Assalto à sede da UDP em A-Ver-o-Mar, distrito do Porto.

18 de Junho – Manifestação promovida pela UDP à porta do Patriarcado, em Lisboa, em defesa da ocupação da Rádio Renascença pelos trabalhadores. Contra-manifestação a favor do patriarcado acaba em pancadaria.

MONSENHOR EDUARDO MELO

Uma estátua está guardada num armazém desde 2003 à espera de ocasião para ser colocada no centro de uma rotunda de Braga – a de monsenhor Eduardo de Melo Peixoto, ainda vivo. A obra está à altura da personalidade: oito metros de altura e três toneladas de peso. O episódio da estátua é revelador da fama do clérigo pelo Minho. Os amigos que encomendaram a estátua amam-no. Mas os que não esquecem o papel de Eduardo Melo no terrorismo de extrema-direita que incendiou o Norte movimentaram-se para impedir que a estátua visse a luz do dia. Monsenhor Melo resignou, há dois anos, ao cargo de vigário-geral da diocese.

LIÇÕES DO ELP SOBRE TERRORISMO

Panfletos distribuídos pelo Exército de Libertação Português ensinavam detalhadamente como fabricar os cocktail Molotov – mistura incendiária numa garrafa, como eles diziam, a «arma por excelência da guerrilha urbana».

A mistura era composta por gasolina (50 por cento), óleo utilizado nos motores de automóvel (25 por cento) e ácido sulfúrico (25 por cento). No exterior da garrafa, deveria ser fixada com fita adesiva uma compressa de gase em forma de saco – que levaria lá dentro uma porção de clorato de potássio equivalente a duas colheres de sopa e a mesma quantidade de açúcar branco, refinado. «Ao ser lançada contra o objectivo, a garrafa parte­‑se. A mistura de gasolina, óleo e ácido sulfúrico incendeia-se e explode em contacto com o clorato de potássio misturado com o açúcar».

O ELP identificava os alvos dos cocktails Molotov: «as forças repressivas do PC-MFA»; «manifestantes»; «sedes de partidos e residências».





O CÓNEGO MELO


Sexta-feira, Maio 02, 2008

Sobre a morte do Cónego Melo

O pesar

O CDS apresentou hoje no Parlamento um voto de pesar pela morte do Cónego. Votos favoráveis do CDS e PSD, votos contra do PCP, BE e PEV, sendo que o PS - o outro partido da direita portuguesa - se absteve hipocritamente e grande parte dos seus deputados saiu da sala antes da votação.

Seguiu-se um minuto de silêncio, onde sairam mais alguns do PS e todos os deputados do Bloco. Sendo lastimável a votação no orgão soberano da República um pesar por esse senhor, a questão que se coloca é o porquê do minuto de silêncio.. ele até era adepto das explosões...

Sócio fundador dos vários Clubes dos Amigos da Bomba: o País a ferro e fogo

Foi activista e próximo de movimentos tão respeitáveis como o ELP, o MDLP e o Maria da Fonte. Foi a par com os seus amigos fascistas Alpoim Calvão ("o vulto mais procurado das redes bombistas de direita" que esteve escondido no Seminário de Braga), Paradela de Abreu (fundador do Maria da Fonte), Spínola (líder do MDLP), Barbieri Cardoso (subdirector da PIDE/DGS e comandante do ELP), e os industriais manos Ferreira Torres entre outros, responsável pelo Verão Quente de 75 em que as sedes dos partidos de esquerda (PCP, MDP/CDE e UDP) foram selvaticamente vandalizadas, incendiadas e atacadas à bomba. Além das sedes dos Partidos ainda o foram as sedes de sindicatos e de associações populares. Mais grave ainda foram as bárbaras agressões a militantes e simpatizentes do PCP e o assassinato do Padre Max (Maximino Barbosa de Sousa, 32 anos, candidato da UDP) e da estudante Maria de Lurdes Pereira, 19 anos, vítimas de um ataque bombista. Estes assassinatos ocorreram já em 1976, muito depois do 25 de Novembro - data histórica para a reacção em Portugal. Ainda, as bombas na Embaixada de Cuba - que mataram 2 diplomatas - e o carro armadilhado junto à sede do PCP na Avenida da Liberdade - que matou uma mulher no dia 1 de Maio - foram outras das muitas actividades destas organizações.

Sé em Julho de 1975 ocorreram 86 acções de violência contra centros de trabalho e dirigentes do PCP e em Agosto, foram contabilizados 153 assaltos, dos quais 55 com destruição dos centros de trabalho do PCP, 25 do MDP/CDE, 39 fogos-postos, 15 bombas e dezenas de agressões. De relevo que, segundo a Polícia Judiciária Militar, só em 1976 e depois da suspensão do Movimento por Spínola no exílio (!), antigos militantes do MDLP ainda fizeram 453 acções terroristas.

Estas organizações eram financiadas por "figuras ligadas à banca e à indústria no antigo regime, como António Champalimaud, Manuel Bullosa, Queirós Pereira e Miguel Quina" e ainda a um nível de estruturas operacionais pelos Manos Ferreira Torres (o irmão mais velho de Avelino, Joaquim, foi assassinado antes do seu julgamento e curiosamente os agentes da PJ que investigavam o crime também sofreram um acidente de viação entre Viseu e Mangualde) ou Valentim Loureiro. Em termos de actividade ofensiva, para além dos referidos em cima, "Ramiro Moreira, chefe de segurança do então PPD, (...) e Manuel Macedo, industrial nortenho agora alvo de uma investigação da Polícia Judiciária por suspeitas de espionagem a favor da Indonésia". Apesar da variedade de organizações no terreno tudo se misturava e o objectivo era sempre o fim dos comunistas. Destas organizações faziam parte a maior parte ex-agentes e oficiais da PIDE e da Legião Portuguesa.

Não tendo estado directamente envolvido em todas as actividades terroristas, o Cónego Melo foi sem dúvida, e aproveitando-se da profunda religiosidade das gentes do Norte, um activista e militante do MDLP que despoletou, patrocinou, defendeu e incentivou o ódio aos comunistas e outros progressistas através de discursos inflamados muito apropriados para quem desejava uma guerra civil para limpar os comunistas de vez e recuperar o regime que a Igreja, durante 48 anos, apoiou. Alcançou muitos dos seus propósitos, mas morreu primeiro que os comunistas!

Documentos históricos

Excerto da propaganda do ELP:

O Exército de Libertação português (ELP) agradece a todos aqueles que, no CDS, PPD, PDC, igrejas, paróquias, bancos, etc., ou em iniciativas de carácter privado, têm apoiado a nossa justa luta, criando um clima propício para a nossa entrada em acção com o fim de limpar o País de todos os cães comunistas e traidores, que nos tentam impedir de sermos o que sempre fomos e de dispormos de nós como muito bem entendemos.

Curioso que o ELP agradeça em 1975 aqueles que votaram hoje o pesar pelo Cónego Melo, às igrejas e aos bancos. Deveras curioso.

Excertos da propaganda do MDLP:

Quando ouvires os sinos da tua freguesia tocar a rebate, vem para a rua com as armas que tiveres: caçadeiras, pistolas, picaretas, enxadas ou gadanhas.

é urgente prepararmo-nos para desencadearmos por todo o Portugal uma cruzada branca contra a opressão vermelha, contra o comunismo estrangeiro, usurpador, opressor e ateu

Mais uma vez é curiosa a referência às igrejas e à cruzada branca.

Não é por acaso que quando Paradela de Abreu cria o grupo Maria da Fonte sabia que "só havia uma estrutura capaz de fazer frente à implantação dos comunistas, a Igreja Católica":

"Cada diocese tem muitas paróquias, logo muitas igrejas, logo muitos sinos. Milhares de sinos ao norte do rio Douro. Centenas de milhares de católicos. Ao pensar nesta 'estrutura' em termos de eventual guerra interna, constatei que o País já estava 'quadriculado' militarmente. Cada paróquia seria uma 'base'. Cada igreja de granito ancestral, um 'reduto'. Cada sino um 'rádio transmissor'. Cada quinta perdida nas serras, um 'apoio logístico'"E terá sido ele a contactar o arcebispo de Braga, que lhe indicou o cónego Melo como mediador."

Moral da História

A morte não lava mais branco. Como diriam algumas pessoas, que a terra lhe pese como chumbo!

Mais informação e referências em:


ou


As outras citações referem-se ao dossier do Público sobre o 25 de Novembro, que curiosamente já não se encontra disponível mas podem-se ler excertos aqui.