Friday, 3 September 2010
O TERCEIRO SEGREDO DE FÁTIMA?
08.05.2010 - 09:09 Por João Manuel Rocha
Só na última das suas três visitas a Portugal, em 2000, se compreendeu plenamente a devoção de João Paulo II por Fátima. O mais andarilho dos Papas que a Igreja já teve acreditava piamente que o chamado "terceiro segredo de Fátima" se referia ao atentado que sofreu em Roma, em 1981, e que fora a intervenção miraculosa de Nossa Senhora que o salvara das balas de Ali Agca. O atentado de 1981 vai marcar a relação de João Paulo II com Fátima.
A devoção mariana do Papa Wojtyla já era conhecida, como mostrava a escolha da expressão Totus Tuus (Eu sou todo teu, aludindo a Maria) para lema do seu pontificado. Mas foi reforçada com o atentado: a data, 13 de Maio, como a primeira das aparições de 1917, e o conhecimento que já tinha do texto do terceiro segredo levaram João Paulo II a estabelecer uma relação entre a mensagem dos pastorinhos e o seu trajecto pessoal.
Depois de alvejado, ainda no hospital, pediu que lhe levassem o documento do segredo. Na interpretação das crianças, que o Vaticano referiu em 2000 ter sido então reiterada por Lúcia, o "bispo vestido de branco" era o Papa, que "cai por terra morto sob os tiros de uma arma de fogo". A visão do Inferno e o anúncio da devoção ao Coração Imaculado de Maria eram os segredos antes conhecidos.
O atentado vai marcar a relação de João Paulo II com Fátima, ponto obrigatório das três viagens que fará a Portugal, e influenciará calendários e itinerários. Na primeira, em 1982, logo à chegada ao Aeroporto de Lisboa, onde é recebido pelo Presidente da República, Ramalho Eanes, e pelo primeiro-ministro, Pinto Balsemão, no rescaldo de uma greve geral promovida na véspera pela CGTP, afirma ao que vem, logo após o beijo no solo com que inaugurava todas as suas primeiras visitas a um país: "Esta minha peregrinação tem um sentido dominante: Fátima. Seguirei depois um itinerário mariano." O mesmo dirá nesse mesmo 12 de Maio, no Palácio de Belém: "Encontro-me em Portugal em visita pastoral e, sobretudo, em peregrinação a Fátima."
Nessa noite, já no santuário, é alvo de uma tentativa de atentado com a baioneta de uma espingarda Mauser de 1914 empunhada por Juan Fernandez Krohn, um padre integrista que não reconhece a autoridade do chefe católico. "Vim para matar o Papa", confessou, segundo A Capital. Poucos dos 700 mil peregrinos calculados pelo jornal se apercebem.
Ao contrário do que sucedera com Paulo VI em 1967, desta vez não há razões políticas que abreviem a visita, que assume carácter de Estado e da qual apenas a UDP se demarca. O programa de quatro dias não dispensa a passagem pelos santuários marianos de Vila Viçosa, Fátima e Sameiro. As mensagens são pensadas para públicos específicos. Em Fátima confirma que, após o atentado de 1981, o seu pensamento "voltou-se imediatamente" para o santuário. No Alentejo defende salário justo para os trabalhadores da terra. Em Lisboa, as suas palavras privilegiam os jovens. Em Coimbra coloca na agenda a cultura. Em Braga aborda os problemas da família, o casamento e o aborto. No Porto, o tema é o mundo do trabalho, a crise e o desemprego.
Rígido na doutrina e avançado no campo social, João Paulo II deixa sinais do que seria uma marca da sua liderança: a busca de empatia com os jovens. A tarde de 14, no Parque Eduardo VII, com "talvez mais [gente] que em Fátima", foi, segundo o Diário de Lisboa, "sem dúvida, o clímax da viagem: uma multidão, onde predominava a juventude de escuteiros e guias, estendia-se até perder de vista, para além de uma zona de segurança". Em Coimbra, a 15, soltará um "Olá malta", que faz títulos de jornal.
Nove anos depois da primeira visita, Wojtyla está de volta para uma visita que decorre entre 10 e 13 de Maio. Mário Soares ocupa o Palácio de Belém e Cavaco Silva está na chefia do Governo. Em Lisboa, no Estádio do Restelo, com prelados africanos, o Papa assinala os 500 anos de evangelização. Cai mal uma alusão à Indonésia como lugar de missionação portuguesa sem que seja acompanhada por qualquer referência à situação em Timor, já ignorada em ocasiões anteriores. A 11, o PÚBLICO escreve em manchete: "João Paulo II volta a esquecer Timor", o que obrigará a uma reacção. "Falei da evangelização que se fazia em Portugal, na época da colonização: são as ilhas das Flores e depois a de Timor", dirá o Papa à Rádio Renascença.
Numa visita catequética, com um roteiro que inclui Açores, Madeira e, necessariamente, Fátima, a agenda aborda temas como a missionação, a situação nos países de Leste, a emigração, a juventude e a espiritualidade mariana. Nas estradas que conduzem à Cova da Iria pedem-se aos peregrinos 20 escudos por um copo de água. No santuário, o Papa volta a lembrar o atentado de 1981.
Em 2000, a viagem tem um objectivo claro: a beatificação dos pastorinhos Jacinta e Francisco e, percebe-se depois, a revelação do segredo. Os anfitriões de Estado são desta vez Jorge Sampaio, como Presidente, e António Guterres, primeiro-ministro. Wojtyla volta, tal como nas vezes anteriores, a encontrar-se com Lúcia. A saúde do Papa é já débil e pressente-se o final de pontificado. "Parece querer estar a "arrumar as gavetas", despedindo-se dos lugares que lhe são queridos, das devoções que mais lhe tocam, dos objectos que mais significado lhe traziam", escreve o PÚBLICO.
SEGREDO REVELADO: PAPA FOI FERIDO EM FÁTIMA
O falecido Papa João Paulo II ficou ferido na sequência do atentado sofrido em Fátima a 12 de Maio de 1982, revela o seu antigo secretário pessoal Stanislaw Dziwisz num documentário a estrear hoje no Vaticano, com a presença de Bento XVI.
Vinte e seis anos após o incidente, o agora cardeal de Cracóvia, Polónia, conta que o padre espanhol Juan Krohn chegou mesmo a golpear o Santo Padre quando este se encontrava no Santuário de Fátima a agradecer a Nossa Senhora por ter sido poupado no atentado de 13 de Maio de 1981. “Posso agora revelar que o Santo Pai foi ferido. "Quando regressámos ao quarto havia sangue, resultado do ferimento”, revela Stanislaw Dziwisz no documentário televisivo ‘Testemunho’, baseado no livro de memórias do homem que acompanhou João Paulo II durante quase 40 anos.
Em todos os relatos até agora conhecidos, nunca se falou da existência de um ferimento provocado pela baioneta de 37 centímetros com que Krohn tentou assassinar João Paulo II. O facto de o Sumo Pontífice ter continuado a sua visita a Portugal como se nada tivesse acontecido ajudou a perpetuar o segredo por mais de duas décadas. Além desta revelação, são contados pormenores sobre os últimos dias de vida de João Paulo II.
OUTRAS NOTAS
VATICANO, 1981
João Paulo II sofreu o primeiro atentado a 13 de Maio de 1981 na Praça de S. Pedro, no Vaticano, tendo sido alvejado pelo turco Ali Agca.
FÁTIMA, 1982
O Papa atribuiu a Nossa Senhora de Fátima o milagre de ter sobrevivido ao primeiro atentado. Um ano depois, durante a sua visita ao Santuário, foi golpeado por um padre espanhol.
KROHN REPETE ATENTADO
Condenado a sete anos de prisão, Krohn apenas cumpriu três. Em 2000, o espanhol foi detido em Bruxelas por ter tentado assassinar o rei Alberto II.
Correio da Manhã
Subscribe to:
Posts (Atom)