Cardeal Bertone. O homem que vai administrar a Igreja até ao fumo branco
Cardinal Tarcisio Bertone, Vatican Secretary of State, at center with red skull cap, officially takes over the vacant See as camerlengo, chamberlain, before sealing Pope Benedict XVI's apartment, after Benedict left the Vatican, Thursday, Feb. 28, 2013. Benedict XVI became the first pope in 600 years to resign Thursday, ending an eight-year pontificate shaped by struggles to move the church past sex abuse scandals and to reawaken Christianity in an indifferent world.
Por Rosa Ramos, publicado em 2 Mar 2013 - 15:11
O Cardeal camerlengo é acusado, no Vaticano, de andar há mais de um ano envolvido em lutas de poder para conseguir ser Papa.
O Cardeal camerlengo é acusado, no Vaticano, de andar há mais de um ano envolvido em lutas de poder para conseguir ser Papa.
Não vai ter de organizar o funeral do Papa, uma das funções reservadas ao cardeal camerlengo, mas terá pela frente outras tarefas de responsabilidade nas próximas semanas, como marcar as congregações ou receber o juramento de silêncio dos cardeais eleitores. Tarcisio Bertone - um dos nomes mais polémicos da Cúria romana dos últimos anos - é o homem encar- regado do governo da Igreja até que seja escolhido um novo Papa.
Salesiano e apaixonado por futebol, começou por ser das figuras de maior confiança de Bento XVI, mas nos últimos meses as relações entre o secretário de Estado do Vaticano e o Papa tornaram-se confusas e difíceis de compreender - até para os analistas e observadores mais atentos da Santa Sé. Tarcisio Bertone, 78 anos, trabalhou durante sete com Ratzinger, quando o alemão ainda era prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Depois de ter sido consultor em vários dicastérios da Cúria, aproximou-se daquele que viria a ser o Papa seguinte: ajudou-o a publicar a terceira parte do segredo de Fátima e estudaram, em conjunto, documentos sobre escândalos de abusos sexuais. Em 2006, depois de eleito Papa, Bento XVI nomeou-o secretário de Estado (número dois do Vaticano), em substituição do cardeal Angelo Sodano. Desde então, Bertone tem somado inimigos e poder. A última promoção a que teve direito aconteceu há pouco tempo: o ano passado foi escolhido camerlengo, substituindo o cardeal espanhol Eduardo Somalo.
Com a responsabilidade a aumentar na Cúria, Bertone foi deixando para trás a carreira de professor e reitor da Pontifícia Universidade Salesiana. No entanto, a sua nomeação para secretário de Estado esteve longe de ser pacífica. Desde o começo, foi acusado de não ter suficiente experiência diplomática para merecer o cargo. E a verdade é que o cardeal nunca foi propriamente um diplomata. Impetuoso, pouco delicado, intrometido nos assuntos da Cúria, imprudente e amigo do poder: é assim que tem sido retratado nos últimos seis anos na imprensa italiana.
O ano passado, o Vatileaks arrastou o nome do número dois do Papa para as manchetes dos jornais: boa parte dos documentos confidenciais do Vaticano vazados para os jornais italianos conduziam, directa ou indirectamente, ao secretário de Estado. Vários jornais chegaram a pedir a sua demissão, classificando o seu governo de “mau”.
Um dos primeiros documentos que chegaram à imprensa, há pouco mais de um ano, foi uma carta do cardeal Daryo Hoyos endereçada ao Papa, que falava de uma suposta conspiração para matar o sumo pontífice e que aludia a confrontos frequentes entre Bertone e Bento XVI. Outros documentos davam a entender que Bertone, se não era um dos principais corrompidos do Vaticano, teria pelo menos fechado os olhos a diversos factos graves. Viganò foi afastado da Santa Sé, depois de ter denunciado ao Papa alegados esquemas de corrupção e muitos atribuíram a sua transferência para os Estados Unidos à influência de Bertone.
Num perfil traçado no El País”, o número dois de Bento XVI é um homem “obcecado pelo poder” e com um gosto especial por controlar directamente os fluxos de dinheiro da Santa Sé. E alguns dos documentos divulgados no Vatileaks revelaram que Bertone não quis perder a comissão de supervisão do Instituto Obras Religiões (IOR), o banco do Vaticano.
Com essa verba, garante a imprensa italiana, o cardeal quereria comprar um hospital falido em Milão. Só que o Papa e o anterior presidente do banco, Ettore Tedeschi - colocado no cargo por Bento XVI para fazer uma limpeza à instituição e com ordens expressas para que lhe reportasse directamente todos os dados - não concordaram com Bertone.
Os conflitos ter-se-ão começado a agudizar e Tedeschi foi expulso - acusado de divulgar documentos secretos e de “incapacidade mental para o trabalho”. A sua saída abalou profundamente o Papa, que terá chorado quando soube do afas- tamento do seu colaborador. Para muitos observadores, aliás, a nomeação do novo presidente do IOR, Ernst von Freyberg, pode muito bem ter sido a derradeira tentativa de Bento XVI de tirar a chave do cofre do banco das mãos de Tarcisio Bertone.
Em Dezembro, numa entrevista ao i, o jornalista italiano Gianluigi Nuzzi, autor do livro “Sua Santità”, que contém boa parte dos documentos do Vatileaks, garantiu que Bertone terá montado nos últimos anos uma verdadeira “operação de poder” no Vaticano, colocando homens-chave em todos os sectores.
O secretário de Estado é agora, embora temporariamente, o líder da Igreja, e vai estar entre os cardeais eleitores do conclave. Contudo, não é um dos favoritos para suceder a Bento XVI - até porque já tem 78 anos.
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