Vatileaks. O misterioso “corvo” reapareceu nos céus de Roma
Por Rosa Ramos, publicado em 8 Mar 2013 - 11:16
Voltaram os autores da fuga de documentos do Vaticano. E, antes do conclave, avisam: “Esperamos que não seja preciso voltar a falar ao mundo”
O Vaticano bem tentou transmitir a mensagem, depois de o mordomo do Papa ter sido preso, de que o caso Vatileaks estava definitivamente arrumado. Mas em vésperas de conclave e após Bento XVI ter renunciado ao trono de S. Pedro, o “Corvo” - a enigmática figura que sempre reivindicou a autoria da operação de entrega de documentos confidenciais da Santa Sé à imprensa - reapareceu ontem nos céus de Roma.
Numa entrevista anónima ao jornal italiano “La Repubblica”, o Corvo explicou por que razão decidiu revelar os documentos sigilosos, o porquê da renúncia de Bento XVI e ainda deixou um aviso: “A Igreja tem a oportunidade, com o próximo Papa, de começar do zero. Esperamos que não seja preciso que o Corvo volte a falar ao mundo.”
Marco Ansalmo, o jornalista que conduziu a entrevista, descreveu a fonte como um homem “crente, fiel à Igreja, profundamente conhecedor da máquina do Vaticano, dos seus protagonistas e entendido nas matérias financeiras” da instituição. Mas o Corvo, explica o “La Repubblica”, não é só este homem. Ou o mordomo do Papa, Paolo Gabriele. O Corvo é um grupo constituído por cerca de 20 pessoas, entre homens e mulheres, leigos e religiosos. Em comum têm estar ligados ao Vaticano e defenderem a “transparência” e a reposição dos bons costumes e da verdade na cúpula da Igreja. Seja como for, o Corvo garantiu que a operação Vatileaks está terminada. “Já não há mais verdades para transmitir ao exterior. Tudo o que importa saber está escrito no relatório secreto compilado pelos três cardeais da confiança de Bento XVI”, garantiu, referindo-se à investigação interna encomendada pelo Papa emérito à situação da Cúria aquando da detenção do mordomo. As conclusões, essas, continuam no segredo de Deus e de mais uns poucos. Além deles só o próximo Papa terá acesso ao documento, depois de eleito.
Assim, o Corvo admite que o sucesso da operação dependerá do próximo sumo pontífice. “Tudo dependerá do Papa que for eleito, da facção que o eleger e de quem for escolhido para comandar a próxima secretaria de Estado”, diz a fonte, acrescentando que haverá sempre cardeais na Cúria a trabalhar no sentido de “bloquear” o caminho rumo a uma Igreja “livre de interesses privados e de corrupção e capaz de falar novamente aos fiéis”. O conclave, segundo o Corvo, poderá permitir à Igreja regressar ao caminho do bem. “A Igreja tem a oportunidade, com o próximo Papa, de começar do zero”, avisa, acrescentando: “Nós continuaremos fiéis à Igreja e ao Papa. E continuaremos a repor a verdade, se isso for necessário. Mas esperamos que não seja preciso que o Corvo volte a falar ao mundo.”
Na mesma entrevista, a fonte garante que Bento XVI não renunciou por causa do Vatileaks. O Papa emérito, conta o Corvo, propôs-se fazer uma limpeza em várias áreas dentro do Vaticano, de maneira a promover a transparência e a verdade. Só que encontrou resistências, o que acabou por conduzir à sua demissão: “Bento XVI sentiu que não conseguia realizar aquilo que desejava.” De acordo com a fonte do “La Repubblica”, a origem de toda a destabilização na Cúria - e a origem do próprio Vatileaks - tem um nome: IOR (banco do Vaticano). O Corvo conta que os problemas de Bento XVI começaram há pouco mais de um ano, quando decidiu confiar a Carlo Maria Viganò a difícil tarefa de coordenar “uma operação de transparência no banco”. Esse trabalho chocou com “interesses instalados” no Vaticano e Viganò acabou por ser afastado da Cúria, sem que o próprio Papa o conseguisse evitar. “Foi então que pensámos dar a conhecer o que se estava a passar dentro da Igreja, desencadeando uma operação de limpeza e de transparência que pudesse fazer aquilo que Bento XVI não estava a conseguir fazer”, garante o Corvo - que continua a dizer que o objectivo do grupo foi sempre ajudar o Papa. Na operação terão estado envolvidos funcionários de várias áreas do Vaticano: de membros da secretaria de Estado a arquivistas, passando por funcionários de museus e gente ligada ao jornal oficial do Vaticano, o “L’Osservatore Romano”. O grupo trabalhou em conjunto de maneira a fazer chegar os documentos aos jornalistas, admitindo o Corvo que pode haver coisas ainda por revelar: “Há documentos que foram divulgados e que não estão no livro do jornalista Gianluigi Nuzzi.”
O que falta saber, só o próximo Papa saberá e só depois de ser eleito. Até lá, o segredo continua na mão dos três cardeais que lideraram a investigação a pedido de Bento XVI.
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